Essa
era a palavra certa para definir a sensação suprema, dentre o turbilhão de
emoções que o atravessavam e arrebatavam naqueles momentos. Inigualáveis,
insuperáveis, indescritíveis e inesquecíveis momentos que transformavam sua
vida chata e monótona em uma aventura sensacional e alucinante. O que causava
tudo isso? Uma combinação perfeita: feriado ou fim de semana, uma boa dose de
disposição, estrada, vento. E ela. Como era bom poder olhar para ela, senti-la,
trazê-la mais uma vez para a claridade do dia e vê-la reluzindo ao sol radiante
de uma clara e quente manhã, quando o canto dos pássaros e a brisa morna
enchiam seu coração de paz e alegria. Sim, ele a amava e amava trazê-la para a
luz do dia, resgatá-la da úmida e fria escuridão de sua garagem. Durante toda a
semana, ao sair da garagem para o trabalho, ele olhava de modo nostálgico para
ela e soltava um suspiro, ansioso para que o fim de semana chegasse logo.
Sentia um aperto no coração ao ter que deixá-la de castigo ali e ir de carro
trabalhar. Mas finalmente chegava o seu dia de folga. Era tempo de estar com
Milla. Batizara-a assim. Milla. Não era uma homenagem a ninguém em especial;
apenas gostava do nome. Se algum dia tivesse uma filha, certamente a chamaria
de Milla.
Os
amantes do motociclismo vão compreendê-lo, pois sabem perfeitamente do que
estou falando. Conhecem a alegria infinita de desfrutar cada sábado ou domingo,
cada dia santo, cada feriado nacional ou cada folga que se obtém no serviço.
Poder acordar bem cedo, vestir roupas confortáveis, colocar uma mochila nas
costas, ajustar o capacete na cabeça e, montando sua máquina, ganhar o mundo lá
fora, que aguarda para ser desbravado. Nada podia ser melhor do que se despir
do empresário que era de segunda a sexta, se ver livre do aperto claustrofóbico
do escritório, do terno que tolhia seus movimentos e da gravata que apertava
seu pescoço. Nada podia ser melhor do que deixar para trás a selva de concreto,
repleta de poluição, de violência, de ganância desmedida, de barulho, de
horários, de estresse, de gente chata. Livre de tudo e de todos, de certa
forma, livre até de si mesmo. Nessas horas, não era mais aquele quem lhe
impunham que fosse. A moto e a estrada o libertavam, e então ele podia ser quem
realmente era e gostava de ser. Na mente? Nenhum tipo de rumo definido. No
coração? Muita ousadia. Na mochila? O básico, nada de relógio ou GPS; só
algumas coisas realmente necessárias e seu celular, para o caso de algum
imprevisto.
E
então o cavaleiro e sua montaria partiam. Nada de horários estabelecidos, nem
regras. Quando saía do perímetro urbano, a tão esperada jornada rumo à emoção
tinha seu início.
A
estrada. O sol. O céu. A paisagem. O vento atingindo furiosamente seu corpo
enquanto ele e máquina ganhavam velocidade rumo o horizonte distante, tão
distante que parecia inalcançável. Ele e sua motoca pareciam fundir-se em um
só, uma mistura inédita de homem e máquina. Sentia Milla vibrar embaixo dele,
que se encontrava confortavelmente acomodado sobre o banco macio e largo. Ele
sorria de satisfação devido à vibração vigorosa da moto embaixo de si, o ronco
possante do motor monstruoso que trabalhava incessantemente e em altas
rotações. Seu coração pulsava rápido e a adrenalina era jorrada impetuosamente
em seu sangue. Extasiava-se com o ronronar suave da máquina a cada vez que ele
trocava de marchas. As grandes rodas giravam poderosamente no asfalto fervente.
Os quilômetros eram carregados pelo vento e rapidamente desapareciam dos
retrovisores; ficavam para trás e perdiam-se na distância, levando consigo os
problemas e o nervosismo da semana. Essa era sua terapia.
Não
conseguia entender como vários conhecidos seus gastavam fortunas e perdiam
tanto tempo em divãs de psicólogos por causa do estresse cotidiano. Pegar a
estrada com Milla era a sua terapia; e o “tratamento” nunca era enfadonho; mas
emocionante e praticamente milagroso. Seria ele maluco como várias pessoas
diziam? Sorriu ao lembrar que um amigo vendera uma casa para poder comprar a
moto dos sonhos e então voar baixo pelas estradas, exatamente como ele fazia
naquele momento. Seria isso loucura? O que se poderia definir como loucura,
numa sociedade tão insana como a atual? Não, ele não era louco. Se fosse,
concluiu que apenas os loucos sabiam de fato o que era felicidade. Passar por
tantos lugares belíssimos, como pontes, cachoeiras, regiões montanhosas.
Conhecer tantas cidades e tanta gente, pessoas comuns e outros como ele. Rodar
junto com outros motoqueiros, as motos rugindo pela rodovia como um bando de
bichos ferozes. Enfrentar com alegria chuvas, ventanias, trechos de asfalto
acidentado. Sentir desse modo que a vida valia a pena ser vivida, cada segundo
dela. E quando chegasse a hora, voltar para casa satisfeito e feliz. Viveria
cada dia da semana pacientemente até que o fim de semana chegasse mais uma vez.
Enquanto estava em seu escritório, as palavras do hino dos motociclistas
ecoavam em sua cabeça: “Born to be Wild” (Nascido para ser selvagem). De fato,
por mais que as circunstâncias tentassem aprisioná-lo, o sábado viria. Milla o
esperava na garagem para mais uma aventura e a estrada os receberia com
alegria. Ele nascera num dia normal, de um mês trivial, de um ano comum.
Todavia, a certeza que o mantinha vivo era esta: viera a esse mundo para ser um
homem livre.
Danilo Alex da Silva
"I'm a cowboy, on a steel horse I
ride" (Sou um cowboy, monto um cavalo de aço)
Wanted Dead or
Alive - Bon Jovi
Que texto lindo, primo!
ResponderExcluirUma definiçao: simplicidade
E como é bom ne, sair por aí, sentindo o vento tocar e admirar as belas paisagens.
Cada um com sua 'Milla', nao importa qual seja, o importante realmente é se sentir livre, se sentir bem.
Parabéns pelo blog
;*
Obrigadão, prima!
ResponderExcluirDeus te abençoe!
abraço