quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

O Dilema de Dean Winchester - Parte IV




Conforme esperava o tempo passar, aguardando o momento de agir, Dean Winchester sentou-se na beira de sua cama de hotel. Sozinho no quarto, pacientemente dedicou-se ao minucioso processo de limpar cada uma de suas armas.
Testava molas. Ele as desmontava, lubrificava peça por peça, limpava o cano delas com o que parecia uma pequena bucha, erguia as armas desmontadas e, fechando um olho como um homem que fizesse pontaria, olhava através do cano, a fim de certificar-se de que removera toda e qualquer sujeira, bem como para saber se o uso frequente não havia causado danos; se fosse esse o caso, seria necessário realizar os devidos reparos, já que uma arma de fogo avariada pela utilização pode ter seu desempenho comprometido, o que seria letal para qualquer um, principalmente para um caçador. Depois de limpar e lubrificar cada arma, ele a municiava, acionava a trava de segurança daquelas que possuíam, e colocava a arma de lado, repetindo todo o processo com a próxima.
Meticuloso como um barbeiro afiando sua navalha ou como um músico de orquestra afinando seu instrumento, Dean Winchester cuidava de seu arsenal com a perícia de um fuzileiro naval. Orgulhava-se de nunca uma arma sua ter emperrado na hora de um tiroteio. Na expressão concentrada e nos seus olhos atentos percebia-se a maior das habilidades que herdara de John Winchester: o profissionalismo.
Na verdade, Dean preparara todo seu arsenal como sempre fazia, por disciplina e precaução, embora soubesse que, para o confronto daquela noite, ele precisaria de apenas uma arma: Sua poderosa escopeta calibre doze de cano duplo serrado, carregada com cápsulas de sal grosso, munição que ele e o pai desenvolveram especialmente para as caçadas que envolvessem fantasmas. Estando com os canos serrados, a potente arma tinha maior dispersão no disparo (é exatamente o que se necessita ao combater um fantasma, a precisão não é tão importante porque o tiro é praticamente “à queima-roupa”), era mais fácil de transportar e esconder sob o casaco, por exemplo, e oferecia mais praticidade porque pode ser empunhada com apenas uma mão. Além da escopeta, no porta-malas do Impala também não poderiam faltar uma pá, saleiro grande, próprio para churrasco, um galão médio de gasolina e um isqueiro. O ritual era sempre o mesmo quando se caçava um espírito vingativo: encontrar a cova, cavar, salgar e queimar o corpo. No cartucho da arma, o sal grosso repele a aparição. No saleiro para churrasco, serve para purificar o corpo. O fogo serve como purificador definitivo, pois o processo crematório liberta o espírito atormentado para o descanso eterno. O problema é que muitas vezes o fantasma aparecia para tentar impedir o caçador. Por isso Dean portava sua escopeta cano duplo serrado, parecida com aquelas que seus heróis dos filmes de faroeste portavam.
Exatamente quinze minutos passados da meia-noite, Dean deixou o quarto de hotel carregando suas “ferramentas de trabalho”, entrou no Impala e dirigiu até o cemitério. Chegando lá, localizou a cova e pôs-se ao trabalho: pendurou a jaqueta marrom na lápide, enfiou a curta escopeta na cintura, empunhou a pá e começou a cavar. Era uma noite sem lua e de poucas estrelas, e a cova de Jayden Alyssa Grace situava-se junto à base de uma frondosa árvore, o que reduzia bastante a já escassa luminosidade. Por esse motivo, Dean entrara com a Baby no campo santo, dirigindo cuidadosamente ao longo da via própria para cortejos, a qual serpeava entre as numerosas lápides e sepulturas.
 Deixara o carro apontado para o túmulo de Jayden com os faróis ligados, a fim de iluminar seu trabalho, enquanto ele cavava e fazia o que tinha de fazer. Banhado pela potente luz sépia de seu Impala, Dean descansou por um momento, enfiando a pá na terra e apoiando-se nela depois de enxugar o suor da testa. Olhou ao redor, vendo-se cercado por trevas e silêncio. Grilos cricrilavam na escuridão e uma coruja solitária piou ao longe. O silêncio mortal apenas foi quebrado pelo som rascante da pá revirando a terra tão logo o caçador voltou ao trabalho. Instantes mais tarde, a pá atingiu uma superfície de madeira. Na borda da cova, Dean removeu com a ferramenta a tampa do esquife. O cheiro que surgiu não era agradável. A visão do esqueleto também não.
Virando o rosto para evitar ao menos em parte o mau cheiro, Dean muniu-se do saleiro e sacudiu-o repetidamente acima da cova, espalhando o tempero de alto a baixo sobre o caixão e os restos mortais daquela que um dia fora uma bela jovem.
Depois de salgar o corpo, pôs de lado o saleiro, despejou uma quantidade considerável de gasolina sobre o caixão aberto e procurou no bolso da calça o isqueiro. Sacou-o e o acendeu. Estava prestes a queimar o corpo e finalizar o serviço quando, o que parecia ser um trabalho tranqüilo, começou a mudar.
Os faróis da Baby inesperadamente piscaram e depois se apagaram; Dean estaria mergulhado na escuridão total não fosse o isqueiro aceso em sua mão. O caçador sentiu a temperatura cair dez graus. Uma brisa sinistra e repentina soprou forte dentro da noite, extinguindo a chama de seu isqueiro.
Trevas.
Ele se preparou para o pior.
Assim que seus olhos se habituaram à falta de luz, parado dez metros à sua direita o rapaz visualizou o assustador espectro de Jayden Alyssa Grace encarando-o fixamente com ódio mortal em seus olhos negros e assassinos.
— Ei, olá! — saudou Dean aparentando calma extrema — Estava me perguntando se você não ia aparecer para o churrasco. Chegou bem a tempo.
O fantasma continuou encarando-o furiosamente, sem se mexer. Por vezes sua imagem tremeluzia, como uma lâmpada vitimada por falha elétrica ou uma projeção holográfica com defeito.
— Jayden Alyssa Grace — falou Dean e depois acrescentou com seu senso de humor característico, mesmo em face dos piores perigos — Seu último nome, Grace, foi inspirado naquele hino, Amazing Grace? — à medida que falava, o jovem Winchester deslizava lentamente a mão até a arma na cintura.
No momento em que a assombração o atacou, ele ergueu rapidamente a escopeta e puxou o gatilho que disparava apenas um tiro de cada vez. A arma dispunha de dois gatilhos: um para disparos em sucessão, e um para desfechar dois projéteis ao mesmo tempo.  Percebeu que sua escolha de desferir um tiro de cada vez fora acertada ao entender a artimanha do espectro, que desapareceu no momento em a arma trovejou escoiceando na mão do atirador. O tiro alvejou o nada. Jayden reapareceu atrás de Dean antes que ele pudesse esboçar reação e o empurrou brutalmente com as duas mãos.
O caçador sentiu os pés saírem do chão e viu-se projetado violentamente contra o tronco da árvore, ao qual sentiu as costas se chocarem. Uma explosão aguda de dor. Uma fisgada na altura das costelas. Achou que alguma delas tinha se partido quando se estatelou. Perdeu o fôlego. Sentiu a arma firmemente presa na mão direita, mas percebeu que o isqueiro escapulira de seus dedos. Praguejando, procurou se levantar.
As costas ardiam. A respiração era difícil. Seus olhos não distinguiam quase nada na escuridão. Tinha que achar o isqueiro. Percebeu uma movimentação sobrenatural um pouco à frente e levantou a escopeta. Sem o isqueiro, tudo aquilo seria em vão. Dispunha de apenas mais uma bala. Depois desse tiro, seria preciso recarregar a arma, introduzindo mais duas cápsulas na câmara. Isso exigiria tempo, um tempo que não tinha. Se recarregasse a arma, não conseguiria achar o isqueiro. Precisava optar. Deveria gastar a última bala com sabedoria.
“O que papai faria se estivesse aqui no meu lugar?” – perguntou-se.
Teve uma ideia. Jayden avançava novamente em sua direção, levitando com rapidez. Dean ergueu a escopeta e bradou:
— Gosta de empurrar os outros, não é, sua maldita? Sente só o “empurrãozinho” que vou te dar agora.
O espírito parecia determinado a acabar com seu caçador. Avançou com uma careta de ódio. Sem esperar mais, Dean apertou o gatilho. A escopeta rugiu com ferocidade em sua mão. A língua de fogo provocada pelo tiro rasgou a noite, clareando por um curto instante a área diante do rapaz. A nuvem de sal grosso dispersada repeliu Jayden, incapacitando-a temporariamente. Antes que a escuridão voltasse a reinar por completo, Dean Winchester avistou o isqueiro caído a poucos passos da cova aberta.
Tinha pouquíssimo tempo antes de o fantasma voltar. Em questão de segundos Jayden ressurgiria. Sem mais esperar, o jovem caçador correu e saltou, mergulhando na escuridão, seguindo o instinto em direção ao último lugar onde avistara o isqueiro.
No exato momento em que seus dedos se fecharam ao redor do precioso objeto, uma força sobrenatural fez com que Dean se virasse de barriga para cima. Dedos gelados comprimiram sua garganta ferozmente, garras tenazes da morte tentando esmagar sua traqueia, obstruindo a passagem de ar, que já era dificultada pela dor extrema na altura das costelas. Debatendo-se vigorosamente, lutando para se desvencilhar, o rapaz começou a sentir a visão embaçar, mas, mesmo através da névoa, divisou o rosto aterrador de Jayden Alyssa Grace flutuando acima dele.
Ele sentiu que sua vida se esvaía. Se não reagisse, em poucos instantes estaria tão morto quanto Jayden.
À beira de perder a consciência, esticou-se ao máximo, acendeu o isqueiro e alcançou a borda da cova. O objeto caiu aceso dentro do buraco, aterrissando em cheio no caixão. Uma pequena centelha encontrou a gasolina e o fogo se alastrou rapidamente. Logo todo o esquife foi tomado pelas chamas, e corpo sofreu a devida cremação.
Dean Winchester viu o fantasma acima de si assumir um tom laranja-avermelhado; Jayden jogou a cabeça para trás e soltou um grito pavoroso de dor. Depois, se dissipou, transformando-se em uma nuvem de infinitas fagulhas ardentes, idênticas àquelas que surgem quando atiçamos carvão em brasa numa lareira.
A temperatura voltou ao normal e os faróis do Impala se acenderam, como se fossem olhos sonolentos na escuridão.
Caído de barriga para cima na beira da cova, ofegando, mais morto do que vivo, Dean exclamou com voz rouca:
— Cara, eu preciso de férias.

***

Continua...


Danilo Alex da Silva


sábado, 19 de dezembro de 2015

O Dilema de Dean Winchester - Parte III





Depois de deixar o hospital no qual Roy Power estava internado, Dean resolveu checar a sombria esquina onde os supostos suicídios estavam acontecendo. Quando subiu a antena e ligou o Medidor de Ondas Eletromagnéticas (o seu famoso EMF), o mesmo acusou imediatamente as alterações no ambiente, emitindo seu zunido característico entrecortado por pequenos estalos que lembravam um pipocar. O aparelho simplesmente pirou: as luzes vermelhas piscaram incessantemente, os ponteiros giraram sem controle. Conforme o jovem Winchester já imaginava, havia uma presença sobrenatural naquele lugar, algo que realmente estava empurrando as pessoas, fazendo parecer com que elas cometessem suicídio. E se havia uma presença maligna incomum ali, Dean precisava combatê-la rapidamente, antes que mais alguém fosse vítima daquela armadilha mortal invisível.

Olhando ao redor à procura de mais alguma pista ou algo que pudesse ajudá-lo na investigação, Dean viu uma câmera de vigilância instalada sob uma marquise do supermercado construído no lugar do antigo prédio abandonado, o mesmo mercado onde Roy estivera antes de alguma coisa tentar matá-lo. Embora a câmera de segurança estivesse em um ponto discreto e fosse preciso muita atenção para enxergá-la ali, ela fora estrategicamente colocada, e seu ângulo certamente englobava o malfadado cruzamento de trânsito, de modo que o caçador teve certeza de que a imagem da “tentativa de suicídio” de Roy Power fora capturada e devia constar ainda nos registros, uma vez que o incidente ocorrera poucos dias antes.

Entrando no supermercado, Dean pediu para falar com o gerente. Apresentou as credenciais falsas, explicou que estava investigando a recente onda local de suicídios e pediu para visitar a sala de videomonitoramento, porque precisava averiguar algumas das imagens armazenadas.

— Realmente uma lástima tantas mortes. Essa esquina é bastante perigosa mesmo. — afirmou tristemente o gerente, para em seguida perguntar, estranhando — Mas não sabia que o FBI tinha interesse nesse caso, agente Kilmister. Desde quando o Bureau investiga suicídios?

Dean pigarreou e aproximou-se para falar em tom mais baixo, como se segredasse algo extremamente confidencial:

— Temos motivos para acreditar que as pessoas foram induzidas a se atirarem na frente dos carros. E se alguém é induzido a se matar, isso não configura suicídio, mas homicídio.

— O que está me dizendo é terrível, agente! Já tem idéia de quem possa estar fazendo uma coisa dessas?

— É o que estou tentando descobrir. Antes que pergunte: sim, tenho um suspeito em mente, mas essa informação é sigilosa. Se eu te contasse, teria que matar o senhor.

O homem estremeceu e Dean esboçou um sorriso divertido. Assim que o gerente saiu, Dean ocupou-se em manusear o equipamento de videomonitoramento.  Retrocedeu cuidadosamente as imagens até o dia do acidente envolvendo o senhor Roy Power. Rebobinar as imagens exigiu um tempo considerável, mas felizmente Dean era paciente, uma característica fundamental a todo caçador.

Finalmente o jovem Winchester reconheceu no vídeo o rosto de Roy Power. Tudo ocorreu conforme o pobre homem narrara: se aproximou da esquina carregando sacolas de compras, e aguardava prudentemente na calçada a mudança do semáforo, indicando que podia atravessar com segurança. Segundos antes de o vídeo mostrar a colisão da van com o homem, curiosamente surgiu um defeito na gravação. A imagem ficou distorcida por um momento e não foi possível ver com clareza o que aconteceu. Um segundo mais tarde, a tela mostrava a van parada meio de lado na pista e a figura de um homem estatelado no asfalto, rodeado por sacolas rasgadas, caixas de leite e cereais, e latas de conserva.

Apertando os olhos, Dean desconfiou daquela interferência na gravação e retrocedeu um pouco a imagem até o instante que precedeu o acidente. Assistiu novamente a cena, mas agora usando o efeito de câmera lenta. Então, dessa vez ele pode ver claramente um espectro branco no vídeo, ao lado de Roy Power. Empurrando o homem em direção à rua movimentada, fazendo com que ele fosse atropelado pela van em disparada. Voltando a cena mais uma vez, Dean Winchester pausou as imagens que se desenrolavam em câmera lenta exatamente no instante em que o vulto aparecia. Era uma mulher de estatura mediana, vestido preto, cabelos negros, expressão maligna e olhos mortos, que pareciam fitar diretamente o caçador, como se soubesse que ele estaria ali, vendo-a por meio do vídeo.

Dean reparou na hora em que o atropelamento ocorrera: faltavam dez minutos para as dezoito horas. Consultou seu próprio relógio e se deu conta que faltavam dezessete minutos para as dezoito horas. A mulher espectral no vídeo parecia um espírito vingativo, e entidades assim muitas vezes tem suas ações associadas ao momento e local de sua morte. Dean levantou-se e correu. Dispunha de poucos minutos para salvar a próxima vítima de ser empurrada para o meio do fluxo conturbado do rush. Passou ventando pelo gerente estupefato do supermercado, atravessou correndo a centena de metros que o separavam da rua e alcançou a porta exatamente às dezessete horas e cinqüenta minutos, torcendo para que não houvesse ninguém esperando para atravessar o cruzamento naquele instante.

Mas infelizmente havia.

Uma mulher jovem se encontrava às margens do asfalto, diante da faixa para pedestres, aguardando que o sinal mudasse para o verde. Muitas pessoas iam e vinham pela calçada, e ninguém reparou na jovem, com exceção de Dean Winchester, que correu em direção a ela. Enquanto corria, Dean percebeu que o clima esfriava drasticamente e, embora não pudesse ver, sabia que o espírito que aparecera no vídeo estava agora ao lado da mulher. E então viu quando a garota foi empurrada. Um observador menos atento poderia achar que a moça tropeçara ou que talvez o salto de seu sapato tivesse quebrado, fazendo-a oscilar perigosamente rumo ao fluxo. Mas Dean Winchester sabia que não era nada disso. Sentira o clima esfriar repentinamente e vira o modo como a moça violentamente perdera o equilíbrio sem explicação, exatamente como se alguém invisível a empurrasse. A ação sobrenatural era inconfundível aos seus olhos treinados.

A moça bracejou desajeitadamente tentando recuperar o equilíbrio sem sucesso e deu um passo cambaleante para o meio da avenida. Nesse momento o jovem Winchester a alcançou e, vigorosamente trouxe-a de volta para a calçada, puxando-a pela orla do sobretudo. Amparou-a. Dois segundos depois, um grande caminhão de granja carregado passou por eles em alta velocidade, fazendo ecoar sua buzina grave. Não havia possibilidade de frenagem. Se Dean não estivesse ali, a moça sofreria morte certa e instantânea.

— Você está bem? — perguntou o caçador segurando delicadamente a garota pelos ombros.

— Estou, obrigada. — agradeceu trêmula. Depois olhou seu salvador com intensidade antes de perguntar — Você sabia, não é? Chegou bem a tempo. Sabia o que ia me acontecer, não sabia?

— Não, senhorita. Era impossível saber. Apenas tive bons reflexos. Agora, por favor, espere aqui. O socorro já está vindo.

Quando a garota deu por si, seu misterioso herói já tinha sumido sem deixar vestígios.

***

Após salvar a mulher da morte certa, Dean entrou em seu Impala e rumou apressadamente para a Biblioteca Municipal de Saint Beatrice, a fim de checar os arquivos da cidade, registros de jornais, principalmente as sessões de obituário. Essa era uma das partes mais monótonas da caçada, porque exigia muita pesquisa e Dean, assim como John, preferia fazer as coisas à moda antiga, analisando recortes velhos de jornal e demais papeladas empoeiradas, amareladas pelo tempo. Sammy se sentia todo superior nessas ocasiões com seu notebook embaixo do braço, dizendo que o pai e o irmão deveriam se render à tecnologia.

— Se aquele nerd estivesse aqui, já teríamos descoberto o que preciso saber. — murmurou Dean para si mesmo e sorriu.  Em seguida, recriminou-se por pensar no irmão e desviou o pensamento. Sammy se fora. Era a ovelha negra. Não se importava se John e Dean estavam vivos ou mortos.

 Concentrou-se na missão.

Pouco tempo depois encontrou a informação que precisava. Os arquivos diziam que oito anos antes uma jovem chamada Jayden Alyssa Grace sofrera uma morte terrível na malfadada esquina onde os suicídios estavam acontecendo. Jayden era gerente de uma loja de cosméticos, se casara havia seis meses, e estava indo para casa contar ao marido sobre a primeira gravidez, quando foi atropelada por um caminhão. O motorista estava embriagado. A pobre moça teve seu corpo despedaçado, de modo que, tanto velório quanto funeral tiveram de ser realizados com o caixão lacrado. Jayden Alyssa Grace tinha vinte e nove anos por ocasião de sua trágica morte no acidente, causada pela irresponsabilidade alheia. Diante da esquina onde tudo se passara, na época, havia um velho prédio que servia como pensão, uma espelunca onde se hospedavam aqueles que precisavam de uma diária mais em conta. Quando viu a foto em preto e branco da jovem, Dean teve certeza de que era a mesma garota do vídeo, aquela que estava empurrando as pessoas para a morte.

Ainda de acordo com os arquivos, os suicídios tinham começado a acontecer recentemente naquele cruzamento macabro. Consultando seu bloco de anotações, Dean Winchester se deu conta de que coincidentemente as mortes tiveram início logo depois que o supermercado construído no lugar do antigo prédio foi inaugurado.

Para o jovem caçador, agora a situação parecia bem clara. Jayden sofrera uma morte violenta oito anos antes, e as circunstâncias de seu óbito transformaram-na em um espírito vingativo, eternamente preso a um ciclo de dor, sofrimento e raiva. Por alguma razão que Dean ignorava, o perigoso espectro permanecera inativo, em estado de hibernação durante todo esse tempo. Quando puseram abaixo o antigo prédio, aquilo que um dia fora Jayden Alyssa Grace surgiu com apetite voraz de destruição, pois se sabe que implosões e demolições tem o poder de despertar espíritos vingativos os quais por acaso hibernem nas proximidades.  Moral da história: todo mundo que fosse fazer compras no supermercado e passasse por ali na hora do rush corria sério risco de ir parar involuntariamente sob as rodas de um carro ou ônibus, porque o espírito de Jayden assombrava o lugar maculado por sua morte brutal, movido unicamente pelo ódio e por sede de vingança. Cabia a Dean resolver essa questão.

Anotando o endereço do cemitério onde Jayden fora enterrada, Dean levantou-se, agradeceu à bibliotecária e saiu. Entrou no Impala e dirigiu até o hotel onde estava hospedado. Já era noite, mas ele precisava esperar que a madrugada caísse para que fazer aquilo que devia ser feito.

***


Continua...

Danilo Alex da Silva

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

O Dilema de Dean Winchester - Parte II








Segurando firmemente o volante, e sem tirar os olhos da estrada, Dean Winchester viajava em velocidade moderada. O rádio rodava uma das centenas de fitas K7 do jovem caçador, as quais continham os grandes clássicos do Rock And Roll. Um solo fenomenal de uma das canções do AC/DC irradiava do aparelho, entretendo o caçador, tornando sua viagem solitária um pouco menos deprimente e enfadonha.
O sensacional Impala 67 corria majestosamente por uma rodovia deserta do interior do Colorado. A lataria negra, incansavelmente polida por Dean, reluzia intensamente sob o sol desbotado do fim de tarde.
Confortavelmente instalado atrás da direção de seu tesouro sobre rodas, Dean segurou por um momento o volante usando apenas a mão esquerda. Ato contínuo, levou a mão direita ao lado do corpo, na altura das costelas, as quais ainda estavam doloridas devido aos excessos da noite anterior. E quando se pensa em excessos da noite anterior, não estamos infelizmente falando de Myla, a bela garçonete que o atendera. Myla era um sonho. O tempo que passou com ela foi a parte feliz da noite de Dean.
A dor nas costelas derivada dos excessos se deveu à parte um pouco menos agradável da noite anterior do filho mais velho de John Winchester. E apesar de amar o que fazia, o rapaz mesmo poderia dizer que seu macabro trabalho lhe rendera aquela dor.
Voltemos um pouco no tempo, para que vocês possam entender melhor o que foi vivenciado por Dean antes de chegar àquela lanchonete.
Dean Winchester tinha sido trazido ao Colorado por dois motivos. O primeiro e mais óbvio, era ter encontrado claramente um caso para sua investigação no jornal. E o segundo, porque o Colorado estava situado coincidentemente no meio do caminho para onde ele pretendia ir, embora relutasse a todo instante e procurasse de todas as maneiras adiar isso. Sim, tinha a ver também com seu bendito dilema.
Dias antes, Dean lera e circulara em um jornal uma notícia sobre o alto índice de suicídios que estavam acontecendo em determinada esquina de Saint Beatrice, uma cidade perto de Denver, no Colorado. Até aí, tudo certo; geralmente não havia nada de sobrenatural em suicídios. Entretanto, um dos supostos suicidas, o qual sobrevivera, afirmara a um repórter que não havia se atirado na frente do carro. Fora empurrado! Declarava com veemência que amava a vida, não quisera se matar. Fora empurrado, e não estava louco.
 O depoimento da vítima (que permanecia anônima por discrição do jornal) era contraditório ao de várias testemunhas, que garantiram ter visto o homem se jogar no meio da movimentada rua, porque, no momento do ocorrido não havia ninguém junto dele. Logo, era impossível que ele tivesse sido empurrado.
Sem mais esperar, Dean entrou no Impala e rumou para o Colorado. Ele, John e Sammy já haviam investigado situações menos intrigantes. Já embarcaram em caçadas por muito menos. Todo tipo de Mal deveria ser detectado e exterminado, esse era o seu lema. Salvar pessoas. Caçar coisas. O negócio da família.
Uma vez em Saint Beatrice, dirigiu-se até a sede do jornal que publicara a notícia e insistia em manter o nome do sobrevivente em sigilo. Para conseguir obter acesso à informação que precisava, exibiu uma credencial falsa do FBI, apresentando-se como agente Lemmy Kilmister.
— Lemmy Kilmister? — estranhou o jornalista redator da matéria sobre o caso — Esse não é o nome do vocalista do Motörhead?
Dean sorrira meio sem jeito antes de responder:
— Ora, essa! Um amante do bom e velho Rock. Isso mesmo, meu coroa era um grande fã da banda. — e procurando desconversar, disse — Fico feliz em saber que ainda há quem curta boa música de verdade. Fãs de country music parecem dominar o país hoje em dia.
Com um pouco mais de paciência e persuasão, finalmente Dean conseguiu o nome do sobrevivente e o endereço do hospital onde o mesmo se achava internado.
— É como já falei para os jornalistas, e como estou dizendo agora para o senhor, agente Kilmister — explicou Roy Power, o homem que supostamente tentara se suicidar e sobrevivera — Fui empurrado. Estava parado na esquina, porque era horário de pico do trânsito. Esperava o sinal para pedestres abrir, para que eu pudesse atravessar a rua em segurança quando — juro por tudo que é mais sagrado, agente — eu senti duas mãos nas minhas costas, me lançando no meio do trânsito. Algo me empurrou na frente daquela van em alta velocidade. Eu não estou louco! Todos disseram que não havia mais ninguém comigo na esquina no momento do acidente, mas eu sei o que senti. Não enlouqueci! No momento carregava sacolas de compras do supermercado. Para que ia fazer uma coisa dessas? Tenho trinta e cinco anos. Estou no auge da minha carreira. Gozo de perfeita saúde. Tenho uma esposa que me ama, e uma filhinha linda de três anos. Por que eu iria querer me suicidar?  Nunca tive nenhum quadro de depressão ou qualquer problema psicológico dessa ordem, meu médico pode atestar isso. Nunca tomei remédios controlados, ou algo que o valha.
Os olhos do homem eram suplicantes, quase chorosos:
— Os médicos disseram que posso estar alucinando em razão do trauma, mas não estou. Falei a verdade. Por que ninguém me ouve? Você tem que acreditar em mim, agente Kilmister!
Com uma palmada amistosa no braço do homem, Dean buscou tranqüilizá-lo:
— Fique calmo, senhor Power. O senhor ajudou muito, pode acreditar. O FBI aprecia sua colaboração. Agora vou indo, está bem? Procure descansar. Preciso apenas que me diga com exatidão o dia e a hora do seu... incidente.
Roy respondeu e Dean escreveu em um bloco de notas, agradecendo em seguida.
Então o rapaz se despediu, levantou-se, encaminhou-se para a saída.
Já no umbral da porta, Dean voltou-se repentinamente, o cenho franzido como se tivesse se lembrado de algo importante.
— Desculpe incomodá-lo um pouco mais, senhor Power. Uma última coisa apenas. Dou minha palavra. O senhor disse que no momento do acidente, estava carregando sacolas de compras?
— Isso mesmo. Voltava do supermercado.
— Esse supermercado fica ali nas redondezas?
— Sim, agente.
— E foi inaugurado recentemente?
— Sim, inauguraram há coisa de um mês.
— Um mês... — repetiu Dean pensativamente — Sabe se havia algo anteriormente no local do supermercado? Se houve alguma demolição, ou algo do tipo?
— Bem, sim. No lugar havia um velho prédio condenado de quatro andares, abandonado, que costumava ser utilizado como abrigo por marginais e moradores de rua. Então, contratou-se uma empreiteira para demolir o prédio e construir no local o supermercado. Mas não entendo, agente Kilmister... Por que está perguntando isso?
Dean sorriu tranquilizadoramente:
— Especulando apenas. Nada demais, não se preocupe. Muito obrigado mais uma vez, senhor Power. Desejo a você uma boa recuperação.
— Agradeço muito, agente. Fiquei feliz em ajudar. Por minha vez, desejo sorte em sua investigação.
— Obrigado, senhor Power — disse Dean já saindo do quarto — Vou precisar mesmo.

***


Continua


Danilo Alex da Silva 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

O Dilema de Dean Winchester







Ele observava o fraco movimento de carros através da vidraça. Olhava para a rua enquanto a mente vagava incansavelmente pelos caminhos insondáveis do nada. Tinha muito para resolver. Uma dúvida torturante o castigava interiormente. Um jovem saudável como ele não deveria ter de carregar o peso de tanta responsabilidade sobre seus ombros. Basicamente, salvar o mundo todos os dias — ou melhor, todas as noites — era o seu malfadado ofício. Aos vinte seis anos de idade, Dean Winchester estava no meio de um dilema. Precisava de uma luz. Qualquer uma.
 Em uma lanchonete quase vazia em algum lugar do interior do Colorado, optara por sentar próximo da janela, que era a única coisa a separá-lo da rua escura, regada por uma chuva miúda insistente. De onde estava, Dean podia ver perfeitamente a grade cromada do radiador de seu belíssimo Impala 67. Imóvel diante do estabelecimento, para o qual estava posicionado frontalmente na área de estacionamento preferencial para fregueses, o carro, negro como a noite, aguardava seu dono para pegarem a estrada mais uma vez. 
O jovem Winchester detivera seu fabuloso automóvel ali cerca de quarenta minutos antes. Fizera uma parada para abastecer a “Baby” e, como o posto de gasolina era coligado à lanchonete, resolveu esticar até lá para forrar o estômago. Não foi uma escolha a qual pudesse levantar arrependimentos, pois tivera uma agradável surpresa ao descobrir na garçonete que o atenderia uma bela loira de olhos verdes, de corpo escultural, seios fartos, bem a seu gosto. Devia ter uns vinte e dois anos, no máximo.
Após saudá-lo e se apresentar como Myla, a atendente anotou o pedido. Pouco depois, esboçando um sorriso sedutor, ela colocou diante de Dean um cheeseburger duplo bastante acebolado e uma Budweiser, a qual ele bebia agora diretamente do gargalo enquanto fitava pensativamente o escasso trânsito local. Concentrou-se em seguida na tarefa de dar uma grande mordida no apetitoso sanduíche. Meneando a cabeça com um gesto de aprovação, abocanhou o lanche uma segunda vez, dizendo para si mesmo de boca cheia:
— Que maravilha! Eu tava cheio de fome!
Em dado momento, sentiu um olhar pesar sobre si e levantou seus olhos. Percebeu que Myla, mesmo atrás do balcão, atendendo outros clientes, sempre arranjava alguns instantes para encará-lo fixamente. Dean devorava o sanduba, e Myla devorava Dean com os olhos. A paquera da garota era ostensiva, ela nem se preocupou em ser discreta. Com a bochecha inchada devido o excesso de comida na boca, Dean sorriu para a jovem, que sorriu de volta.
Cheeseburger no capricho, garçonete bonita... Acho que essa noite vou me dar bem!
A possibilidade de diversão o animou, ajudando-o até mesmo a esquecer temporariamente seu duro dilema. Minutos mais tarde, depois de ter devorado por completo seu hambúrguer e esvaziado sua cerveja, fez sinal para a bela jovem, a qual se aproximou imediatamente.
— Estava ótimo, querida. Bonzão mesmo. Você merece uma boa gorjeta pelo atendimento. Agora, traga a conta para mim, sim?
— Gostaria de algo mais? — ela indagou com uma piscadela maliciosa.
Ao notar as intenções da moça, Dean Winchester esboçou seu característico sorriso safado. Inclinando-se para frente e apoiando os cotovelos na mesa, olhou para ela de modo sedutor. Limpando a garganta, disse sem rodeios:
— Bem, na verdade, sim. Sabe, eu adoraria uma bela de uma sobremesa, mas o problema é que não sei se você está incluída no cardápio.
Rindo ela, respondeu:
— É, realmente não faço parte do menu. Porém, acho que podemos resolver isso depois do meu turno. Que tal? Saio em uma hora.
Dean consultou seu relógio de pulso. Passavam cinco minutos das vinte e três horas.
— Uma hora, heim? Ok, boneca. Não vou a lugar algum, pode apostar. A propósito, meu nome é Dean Winchester.
— Encantada, Dean. Trago a conta em um minuto.
O jovem caçador pagou em dólares. Dinheiro vivo. Seu “dinheiro suado”, como costumava chamar a grana obtida em bilhar. Ao pensar nisso, seu rosto se iluminou. Ainda tinha uma hora pela frente, e precisava encontrar uma maneira de matar o tempo. Olhou para as mesas de bilhar. Uma estava vazia. A outra era circundada por três jogadores soturnos. Dean esfregou as mãos. Algumas rodadas de sinuca não fariam mal.
Aproximando-se, indagou:
— Cabe mais um aí nesse jogo?
Foi aceito. Empunhou o taco. Usou giz para polir a superfície da ponta do mesmo. Inclinou-se e se preparou para jogar. Desferiu a tacada certeira. Encaçapou a bola desejada. Ouviu o resmungo dos outros jogadores e sorriu. Aquilo não era um jogo, era um massacre. Dean Winchester se mostrava imbatível no bilhar. Aprendera a jogar com o pai. “Não se pode pagar tudo com cartão de crédito fraudado.” — sempre dizia John, e explicava: “Dinheiro às vezes é imprescindível durante as investigações que precedem nossas caçadas. Dinheiro compra informações. Nada abre tantas portas como as boas e velhas verdinhas americanas. Por isso, vamos jogar bilhar e ganhar grana.”
Sam detestava sinuca. Interessava-se mais por outras coisas. Coisas que não eram úteis para caçadores. Ele e o pai já haviam discutido por causa disso. Dean presenciara brigas terríveis entre os dois. Agora, o pai estava desaparecido. E Sammy tinha ido embora há quase dois anos. Jurara não mais caçar. Nunca mais.  Queria fazer faculdade. O pai dissera que se ele fosse não precisava voltar. Sammy não voltou.
  Semanas antes, John havia se separado de Dean, incumbindo seu filho mais velho de resolver um caso de vodu em Nova Orleans, enquanto ele próprio seguia para Jericho, na Califórnia, onde, numa estrada, em um trecho de oito quilômetros, homens estavam desaparecendo inexplicavelmente havia quase duas décadas. O carro do último fora encontrado, mas o motorista, nunca. John Winchester partira para investigar esse caso e não dera mais notícias. Não atendia nenhum dos celulares, não deixava mensagens. Sumira.
Resumindo: Dean estava sozinho.
Sentia que o pai estava em perigo. Seus instintos apurados de caçador, que raramente falhavam, lhe diziam isso. Talvez pudesse até mesmo estar... (morto?) Nem queria pensar numa coisa dessas. John precisava dele. Dean sabia o que fazer. Tinha que ir procurar o pai. Mas não queria fazer isso solitariamente. E também relutava em ir pedir ajuda ao irmão mais novo. Nisso consistia seu terrível dilema.
Rodeando a mesa forrada com pano verde, ele usou novamente o giz na ponta do taco e posicionou-se, buscando o melhor ângulo para a próxima jogada. Fez um esforço para afastar Sammy dos pensamentos por ora. Diante de seus olhos esverdeados dançaram imagens vívidas do pai. Gostaria que John estivesse ali com ele, depenando aqueles vacilões metidos a mestres do bilhar, os quais, na verdade, mal sabiam segurar o taco. John e seu filho Dean costumavam chamar aquilo de “Caçar patos.” Tinham bolado até uma estratégia para atrair “patos” e ganhar deles um bom dinheiro. O plano era o seguinte:
John entrava em um bar que contasse com mesas de bilhar. Passados dez minutos, Dean entrava também e desafiava John para jogar. Dizia para quem quisesse ouvir que era invencível na sinuca. Atuando magistralmente, fingindo ver Dean pela primeira vez na vida, John aceitava e ambos jogavam. Tanto barulho atraía curiosos, que se aproximavam para acompanhar o desempenho do petulante rapaz. Durante a partida, na qual apostavam ficticiamente cinqüenta dólares, Dean era sobrepujado pelo pai. Fingia não saber segurar um taco direito, jogava mal, deixava o taco escorregar na hora da jogada. Ao fim da partida, o vitorioso John pegava o dinheiro e deixava o bar. Simulando estar furioso com as risadas dos presentes, Dean explicava que o outro sujeito tivera sorte. Afirmava que ganharia a próxima rodada, e apostava cem dólares contra qualquer um que quisesse jogar com ele. Os patos viam ali uma ótima oportunidade de granjear dinheiro fácil, acreditando na imperícia daquele rapaz maluco. Casavam as apostas. E perdiam feio, porque dessa vez Dean não mais encenava, e empregava toda a sua habilidade na partida. Rapelava os demais jogadores, pegava o dinheiro e ia embora.
Claro que diversas vezes os jogadores se indignavam ao perceber o golpe, e alguns mais exaltados partiam para cima de Dean, que rapidamente era socorrido por John. Afinal, quando é que os Winchester fogem de alguma briga?
Uma hora se passou em um piscar de olhos. Quando Myla se aproximou para chamar Dean a fim de irem embora, o rapaz tinha os bolsos cheios de cédulas e acenou uma despedida para os jogadores os quais, falidos, acenaram de volta com expressões infelizes.
Segurando a porta, Dean virou-se para Myla e avisou:
— É melhor se agasalhar bem, gatinha. A noite está fria e chuvosa. Pelo visto, o clima desse fim de Outubro não está para brincadeira.
Aceitando o conselho, ela subiu o zíper do casaco e envolveu o pescoço em uma echarpe vermelha. Saíram da lanchonete.
Conforme o rapaz caminhava, a bela garçonete o seguia. Deram alguns passos em direção à Baby, ao mesmo tempo em que o caçador sacava as chaves do bolso de sua indefectível jaqueta marrom de caça. Quando ele abriu a porta de seu sensacional veículo, a linda garota estacou de repente arregalando os olhos:
— Uau! Esse carro é seu?
— Sim. — respondeu ele com um sorriso orgulhoso — É o xodó do papai aqui. Gostou?
— Demais! Muito maneiro! É um Chevy Impala, não é? — quis saber Myla deixando seus olhos verdes correrem pelo belo carro negro, antigo e de quatro portas. A lataria estava brilhando, mesmo molhada pela garoa persistente.
— Isso aí. — Dean abriu um sorriso radiante — Garota esperta. Quer dizer então que gosta dos clássicos? To vendo que é bem mais do que um rostinho bonito.
— Você nem faz ideia... — retrucou ela, enigmática e sedutora.
Com um assobio brincalhão, Dean entrou e puxou a porta. A moça o imitou. O rapaz acomodou-se atrás do volante de seu magnífico Impala. Deu a partida. O motor imenso roncou baixo, ainda que de forma possante. Sempre olhando pelos retrovisores, Dean engrenou a ré, desceu o carro para o asfalto, manobrou e subiu a rua, admirando vitoriosamente de soslaio sua invejável passageira.
O futuro de Dean Winchester parecia nebuloso. Sua família nunca fora exatamente aquilo que se pode chamar de comum. Seu trabalho era assombrado. E ele ainda tinha um dilema muito delicado para resolver. Mas não naquela noite. Naquela noite ele precisava de descanso. De companhia. De diversão. Mais do que precisava, ele queria isso. E não somente queria, como merecia.
Se Dean Winchester decidiu isso, então estava decidido.
O Impala acelerou noite adentro.

*** 

Continua...     



Danilo Alex da Silva